“Nossas pautas são convergentes”, disse o presidente ao anunciar reforma agrária com prioridade para mulheres e prevenção ao feminicídio
Por Gilson Camargo / Publicado em 16 de agosto de 2023
Matéria Jornal Extra Classe
Marcha das Margaridas reuniu mais de 100 mil mulheres em BrasíliaFoto: Ricardo Stuckert/ PR
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) participou, nesta quarta-feira, 16, do encerramento da 7ª Marcha das Margaridas, em Brasília.
Durante discurso para cerca de 100 mil mulheres, Lula falou sobre violência política, lembrou o período em que esteve preso, em Curitiba, e citou a morte de Margarida Alves, trabalhadora rural paraibana assassinada a tiros na porta de casa em 1983.
“Os poderosos, os fascistas, os golpistas podem matar uma, duas ou três margaridas, mas jamais resistirão à chegada da primavera”, disse o presidente à multidão de trabalhadoras rurais, quilombolas, indígenas e assentadas da reforma agrária.
“A vinda de vocês aqui hoje demonstra que só pensa em dar golpe quem não conhece a capacidade de lutas de homens e mulheres desse país”, completou.
Margaridas
Marcha das Margaridas reuniu mais de 100 mil mulheres em Brasília
A Marcha das Margaridas começou a ser realizada há mais de 20 anos e é promovida a cada quatro anos pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), com o apoio de federações de trabalhadores, sindicatos e outras entidades.
O evento é realizado sempre em agosto para recordar o mês em que Margarida Alves, trabalhadora rural nordestina e líder sindical, foi assassinada, em 1983.
Ela ocupou por 12 anos a presidência do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande, na Paraíba.
Maria do Rosário lembrou que o Plenário do Senado aprovou, na terça-feira (15), o Projeto de Lei 4288/16, que inscreve o nome de Margarida Alves no Livro dos Heróis da Pátria. O livro está depositado no Panteão da Liberdade e da Democracia, em Brasília.
A proposta, que já havia sido aprovada pela Câmara, segue agora para sanção presidencial.
Pacto contra o feminicídio
“Os poderosos, os fascistas, os golpistas podem matar uma, duas ou três margaridas, mas jamais resistirão à chegada da primavera”, disse Lula à multidãoFoto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil
Durante a Marcha das Margaridas, o presidente da República anunciou um pacote de medidas de governo que beneficiam as mulheres, como a criação de um plano emergencial de reforma agrária e de um pacto nacional de prevenção ao feminicídio.
“Nossas pautas são convergentes. Nossos sonhos são os mesmos. Foi para isso que eu voltei. Para fazer do Brasil um país capaz de corrigir as injustiças”, discursou Lula, afirmando que é preciso criar uma cultura de respeito no campo e nas cidades.
“Não toleraremos mais discriminação, misoginia e violência de gênero. Não podemos conviver com tantas mulheres sendo agredidas e mortas diariamente dentro de suas casas, como também não é possível achar normal que, exercendo a mesma função, uma mulher ganhe menos que um homem”, enfatizou ao lado de ministros.
Segundo Lula, os sete primeiros meses de seu mandato foram dedicados à retomada e ao fortalecimento de políticas públicas “destruídas nos últimos anos”.
Ele citou, como exemplo, a retomada do Plano de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Plano Safra da agricultura familiar, previsto pelo governo como o maior da história do país.
“O resultado dessas ações já é visível. O preço dos alimentos está caindo, o desemprego também caiu. O Brasil já está melhor e vai melhorar ainda mais”, sinalizou.
O presidente também apontou o acerto das políticas econômicas e acenou com mais distribuição de renda.
“A economia vai continuar crescendo e nós vamos dividir o resultado desse crescimento com o povo brasileiro. Só faz sentido um país crescer se a riqueza desse crescimento for distribuída, chegar nas mãos de vocês, fazer a roda da economia girar e melhorar a vida das pessoas”.
No Plano Emergencial de Reforma Agrária a pontuação para famílias chefiadas por mulheres no processo de seleção para ter acesso à terra será dobradaFoto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil
Pacote
No Plano Emergencial de Reforma Agrária anunciado pelo chefe do Executivo, a pontuação para famílias chefiadas por mulheres no processo de seleção para ter acesso à terra será dobrada.
Lula também assinou decretos na solenidade promovida na Praça dos Três Poderes durante a Marcha, retomando ou instituindo iniciativas de governo para as mulheres:
– Programa Quintais Produtivos para promover a segurança alimentar e nutricional de mulheres rurais;
– Seleção de famílias e retomada da reforma agrária;
– Comissão de enfrentamento à violência no campo;
– Grupo de trabalho interministerial para o Plano de Juventude e Sucessão Rural, destinado a oferecer serviços públicos para a população jovem da agricultura familiar e ampliação das oportunidades de trabalho e renda para esse público;
– Programa Nacional de Cidadania Bem Viver para as Mulheres Rurais, para retomada de programa nacional de documentação da trabalhadora rural;
– Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios;
– Retomada da Política Nacional para os Trabalhadores Empregados, para fortalecer os direitos sociais desses operários; e
– Retoma o Programa Bolsa Verde, que faz pagamentos a famílias de baixa renda inseridas em áreas protegidas ambientalmente.
Lula disse que os anúncios são uma resposta às prioridades definidas pelo movimento das trabalhadoras rurais e convergem para a autonomia econômica e inclusão produtiva delas.
Legislativo
A Câmara dos Deputados anunciou que irá acompanhar a pauta apresentada pelas trabalhadoras durante a MarchaFoto: Vinicius Loures/Câmara dos Deputados Fonte: Agência Câmara de Notícias
A Câmara dos Deputados anunciou que irá acompanhar a pauta apresentada pelas trabalhadoras durante a Marcha, composta de 13 eixos políticos.
“Estamos instituindo, com a deputada Benedita da Silva (PT-RJ), coordenadora da Secretaria da Mulher, uma comissão, um grupo de trabalho específico e especial, para organizarmos o acompanhamento de toda a pauta que recebemos”, anunciou a segunda secretária da Câmara dos Deputados, Maria do Rosário (PT-RS).
“Uma pauta que trata da saúde e da assistência social pública, da autonomia econômica, da inclusão, da educação pública não sexista e antirracista, da defesa das mulheres, da soberania alimentar e nutricional”, detalhou a parlamentar.
Uma das reivindicações da Marcha é a aposentadoria das trabalhadoras rurais, que será facilitada com a regularização da documentação. “As mulheres do campo muitas vezes enfrentam uma jornada tripla de trabalho e têm mais dificuldades de obter os benefícios previdenciários”, lembrou Dilvanda Faro (PT-PA)
Ministérios
O governo também anunciou que serão assinadas dez portarias durante a semana por vários ministérios para atender às reivindicações da Marcha das Margaridas. “Hoje assino uma portaria instalando de volta o Fórum Nacional de Políticas para as Mulheres Agricultoras do Campo, da Floresta e das Águas”, adiantou a ministra das Mulheres, Cida Gonçalves.
Ela acrescentou que outro fórum será criado para discutir as questões referentes às mulheres pescadoras, marisqueiras e das águas, para debater uma política nacional para o setor.
Já o ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Paulo Teixeira, anunciou que ao todo serão entregues 90 mil quintais produtivos no País, dando acesso a insumos, equipamentos e utensílios necessários para mulheres do campo.
No dia 8 de março, segundo ele, já foram disponibilizados R$ 50 milhões em assistência técnica e extensão rural para as mulheres, e hoje serão disponibilizados mais R$ 25 milhões em assistência técnica para a prática agroecológica no País, metade destinado às mulheres.
Além disso, ele lembrou que, no Plano Safra da Agricultura Familiar 2023/2024, foi dobrado o valor do chamado Pronaf B (microcrédito produtivo, destinado aos agricultores familiares de baixa renda) para as mulheres.
A secretária de Mulheres da Contag, Mazé Morais, explicou que a pauta da marcha foi entregue no dia 21 de junho ao Executivo e ao Legislativo. Segundo ela, a última marcha, em 2019, foi a marcha da resistência, e a deste ano é a da reconstrução de um bem viver para as mulheres do campo.